Autor: Pedro Ivo Bueno
Presidente do SINDGUARDAS-MG
O contexto atual da Guarda Municipal de Belo Horizonte é de crise, mas não estou falando da crise institucional, provocada sobretudo por denúncias de grampos, nepotismo, má utilização do dinheiro público e tantas outras irregularidades ocorridas na administração, que vieram à tona contribuindo de forma generalizada para uma outra crise, a crise moral; mas ainda não é sobre esta de que se trata este artigo.
Na atual conjuntura, podemos perceber, algumas vezes de maneira explicita, e outras de forma bem subjetiva, que a Guarda passa também, talvez por uma das piores crises, que seria a de identidade. Essa crise exerce uma influência direta no comportamento dos operadores frente às outras crises, uma vez que é esta identidade que vai fundamentar os princípios que deveriam nortear tanto a instituição, quanto os próprios guardas.
Ao repensar e remontar a história da Guarda Civil somos remetidos à um passado que reflete de maneira sistemática no presente da segurança pública. Esse passado envolve a extinção de uma entidade civil (Guarda Civil), que se deu por questões políticas em um governo centralizador de doutrina militar, que embora tenha exercido forte domínio nos meios de comunicação, coibindo e censurando qualquer outra política considerada incompatível, ainda foi capaz de impôr uma incontestável sensação de prosperidade, operando uma política simbolizada pela emblemática frase; “Brasil: Ame-o ou deixe-o”. Contudo, ao final deste período conturbado, deu-se início providencial, de uma forma lenta, gradual e irrestrita uma abertura a novas políticas; salvaguardando os ditadores e anistiando civis sem poderes democraticamente constituídos.Nestes mesmos moldes, podemos dizer que nossa Guarda Civil foi "anistiada" através do texto contitucional (art.144 §8°), prevendo a criação de Guardas Civis Municipais, porém, em outra esfera federativa, com atribuições limitadas e sem a devida regulamentação. Sendo assim, entendo que não alcançamos a democracia plena, mesmo com a Constituição de 1988, agindo o legislador de forma comedida, não atribuindo poderes legítimos de defesa a força civil armada dos municípios, ente federativo indepedente e responsável, segundo a própria Carta Magna, pelos serviços essenciais como a segurança pública (certame que poderemos minuciar em outro artigo).De volta à nossa atual conjuntura, não compactuo com a idéia de que um corpo civil deve ser militarizado para que tenhamos hieraquia e disciplina, militares têm suas características que devem ser cultivadas na defesa da pátria em risco eminente, remontando as grandes batalhas medievais ou mesmo contemporâneas, mas um cidadão brasileiro, vivendo em um Estado democrático de direito, em um país emergente, se dignifica com um trato civil em meio ambiente urbano, não sendo assistido como contraventores de guerra. Nossa atual crise de identidade não poderia ser menos latente, tendo em vista um corpo comandado por oficiais reservistas da força militar estadual PMMG, onde grande parte do efetivo é composto também por homens oriundos das forças armadas, cuja maioria exerce cargos de intermediária chefia, estimulados ao natural cultivo da ordem unida, regimentos, nomenclaturas e continências, típico da caserna, algo admirado pelo sincronismo e enraizado pela doutrina, diariamente enfatizada por estes.Todavia, essencialmente prejudicial ao nosso corpo de Guarda Civil, que tem como gênero de seguimento polícias eminentemente civis como NYPD, LAPD, SCOTLAND YARD, tendências mundias de "polícias disciplinadas" na defesa de cidades cosmopolitanas ultra civilizadas como New York, Los Angeles e Londres que, tem como filosofia a crença de que "o povo é a polícia e a polícia é povo, a polícia nada mais é do que aqueles pagos e uniformizados para fazer aquilo que é dever de todos nós¹".
O passado de polícia cidadã se torna evidente quando somos abordados por senhores e senhoras que demonstram reviver a agradável nostalgia de rever a dupla de Cosme e Damião trajando seus distintos uniformes em azul marinho, relembrando a antiga Corporação, mas por observar e perceber traços do militarismo se perdem na lembrança da saudosa Guarda Civil.
A Guarda Municipal é o ressurgimento da Guarda Civil, em outros moldes, em outro contexto social e de segurança, cabendo a todos nós, operadores da segurança pública e sociedade organizada, promovermos o resgate de uma identidade que não pode jamais ser perdida no tempo.
¹ Sir Robert Peel 1828, pai do policiamento moderno.
Colaboração: Renata de Queiroz
A formula de Radbruch como garantia do direito à sindicalização do guarda municipal de BH
- Ronaldo Brito
- BH, MG, Brazil
- Mestrando em Direito (PUC/MG). Advogado. Professor. ronaldoabjunior@gmail.com
By Ronaldo Brito
Existe uma lei editada em 2007 pelo Município de Belo Horizonte/MG (Lei 9319/2007 – Estatuto da Guarda Municipal) que em seu artigo130, dispõe sobre a proibição ao guarda municipal de Belo Horizonte se sindicalizar. No entanto, tive a oportunidade de ver um parecer técnico, enviado pelo Secretário Municipal de Segurança Urbana e Patrimonial de Belo Horizonte, ao Ministério Público de Minas Gerais, justificando a existência de tal norma. Em sua justificativa consta que o guarda trabalha diretamente com a segurança pública, o que justifica o seu tratamento diferenciado dos demais profissionais e o impedimento de sindicalizar-se.
Esse parecer muito me assustou, tendo em vista que o direito de criar associações sindicais é um direito fundamental que foi violado em vários países nas épocas em que estes adotaram regimes autoritários ou totalitários. Temos como exemplo a Alemanha nazista que extinguiu os sindicatos os quais foram substituídos pelo “Deutsche Arbeiterfront” ou Frente Alemã do Trabalho. No Brasil, o golpe militar de 1964 significou a mais intensa e profunda repressão política que a classe trabalhadora enfrentou na história do país. As ocupações militares e as intervenções atingiram cerca de 2 mil entidades sindicais em todo o país. Suas direções foram cassadas, presas e exiladas. A desarticulação, repressão e controle do movimento foram acompanhados de uma nova política de arrocho de salários, da lei antigreve nº 4.330 e do fim do regime de estabilidade no emprego.
Ora, o direito de criação de entidades sindicais é um direito fundamentai que nada mais é do que são condições mínimas, básicas, necessárias para se garantir uma existência digna de todo e qualquer trabalhador.
Art. 5º, inciso XVII – é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;
Art. 5º, inciso XVIII – a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;
Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;
Ainda, o art. 37, inciso VI da Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, assegura ao servidor público civil à livre associação sindical. A sindicalização é proibida somente ao militar, ou seja, àqueles que ocupam os quadros das Polícias Militares, Bombeiros Militares e das forças armadas: Marinha, Exercito e Aeronáutica. No entanto entendemos que essa proibição é inconstitucional tendo em vista que foi introduzida pela Emenda Constitucional de número 18, em 1.998, pois viola cláusula pétrea.
Portanto, o guarda municipal de Belo Horizonte é servidor público civil, e, conforme a Constituição Federal, tem todo direito a associação e a sindicalização.
A Guarda Municipal de Belo horizonte é um órgão público da administração pública direta, subordinado à Secretaria Municipal de Segurança Urbana e Patrimonial. Portanto, é incontestável que os guardas municipais têm pleno direito a livre sindicalização, conforme previsto no artigo 37 inciso VI da Constituição Federal que assim dispõe:
Art. 37 - VI - é garantido ao servidor público civil o direito à livre associação sindical;
Da mesma forma é previsto na Lei Orgânica do Município de Belo Horizonte:
Art. 58 - É livre a associação profissional ou sindical dos servidores públicos, nos termos da Constituição da República.
Assim também dispõe a Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Decreto Legislativo 206 do Congresso Nacional:
Artigo 4.º
1 - Os trabalhadores da função pública devem beneficiar de uma protecção adequada contra todos os actos de discriminação que acarretem violação da liberdade sindical em matéria de trabalho.
Artigo 6.º
1 - Devem ser concedidas facilidades aos representantes das organizações de trabalhadores da função pública reconhecidas, de modo a permitir-lhes cumprir rápida e eficazmente as suas funções, quer durante as suas horas de trabalho, quer fora delas.
Não pode um dispositivo de lei municipal, que contém regra que viola frontalmente a Constituição, prevalecer diante de um caso concreto. Quando se tem uma antinomia jurídica é necessário se valer dos meios ou técnicas de resolução. Antes que seja aplicada ao caso a regra da especialidade é necessário aplicar a regra da hierarquia. Isto é, quando se tem duas normas antagônicas é necessário verificar se existe hierarquia entre elas, tendo em vista que norma superior derroga norma inferior.
Ora, a Constituição Federal é bem clara ao garantir à livre sindicalização á todos os servidores públicos civis. O guarda municipal de Belo Horizonte, como qualquer outro guarda municipal de qualquer município brasileiro é servidor público civil, sendo que servidores militares são apenas os pertencentes aos quadros das forças armadas: Marinha, Exercito e Aeronáutica, e as Polícias Militares e Bombeiros Militares.
Não pode ser restringindo um direito fundamental sem qualquer explicação lógica e legitima. O guarda municipal de Belo Horizonte exerce a função de vigilância dos prédios e instalações municipais além de fiscalização de transito a auxílio na defesa civil. Não há, portanto, qualquer justificativa plausível que demonstra a necessidade de restringir o direito fundamental á livre associação sindical. Permitir a violação deste direito é um brutal desrespeito aos direitos fundamentais da pessoa humana e da supremacia da constituição frente à legislação ordinária.
Ora, o direito de criação de entidades sindicais é uma condição mínima, básica e necessária para se garantir uma existência digna de todo e qualquer trabalhador.
Desta maneira assim preceitua a Lei Orgânica do Município de Belo Horizonte:
Art. 4º - O Município assegura, no seu território e nos limites de sua competência, os direitos e garantias fundamentais que a Constituição da República confere aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País.
Negar o exercício de um direito constitucional seria negar a existência da democracia, do estado de direito, da soberania popular e consequentemente, da própria dignidade da pessoa humana.
As normas constitucionais e legais que garantem ao servidor o direito a livre sindicalização e a garantia de seus direitos e prerrogativas são normas de eficácia plena, pois podem ser aplicadas imediatamente, independentes de posteriores normas infraconstitucionais que a detalhe, por já conter em si todos os elementos necessários para a sua aplicação imediata.
Neste sentido é a lição de José Afonso da Silva:
Completa, nesse sentido, será a norma que contenha todos os elementos e requisitos para a sua incidência direta. Todas as normas regulam certos interesses em relação à determinada matéria. Não se trata de regular a matéria em si, mas de definir certas situações, comportamentos ou interesses vinculados a determinada matéria. Quando essa regulamentação normativa é tal que se pode [1]saber, com precisão, qual a conduta positiva ou negativa a seguir, relativamente ao interesse descrito na norma, é possível afirmar-se que esta é completa e juridicamente dotada de plena eficácia, embora possa não ser socialmente eficaz.
De antemão, destaco que as regras e princípios são normas e a distinção entre eles são distinções feitas entre normas. Para se poder fazer uma distinção como a sugerida, existem vários critérios:
a) critério de abstração: os princípios são normas de um grau de abstração relativamente mais elevado do que o grau de abstração das regras;
b) critério quanto a aplicabilidade: os princípios são conteúdos normativos extraídos de dispositivos que devem ser concretizados pelo julgador, legislador ou administrador. Isto é, os princípios são vagos e para serem aplicados precisam da atividade concretizante, ao passo que as regras, pelo fato de sua especificidade, podem ser aplicadas imediatamente.
Qualitativamente os princípios podem ser diferenciados das regras, tendo em vista que aqueles determinam um mandamento de otimização. Isto é, podem ser aplicados em graus no momento de concretização de uma regra. Já as regras são normas que trazem uma exigência que não pode ser cumprida em graus, pois somente podem ser cumpridas ou descumpridas em sua totalidade.
Destaca-se que os princípios coexistem e podem ser aplicados ao mesmo caso concreto mesmo quando em conflito, já as regras, quando em conflito, se excluem, são antinômicas, não havendo a possibilidade de aplicação simultânea quando houver colisão.
Nos casos de conflito entre princípios é necessário a utilização de técnicas de argumentação a fim de que se faça uma ponderação racional e legítima entre eles, jamais podendo declarar por este motivo a invalidação de um deles.
As regras também podem entrar em conflito, mas quando isto ocorrer é necessário utilizar-se dos critérios de resolução de antinomias: hierarquia, especialidade, posterioridade etc., podendo se for o caso, ser declarada a invalidação de uma delas.
(...) o ponto decisivo na distinção entre regras e princípios é que os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Neste entendimento princípios são mandamentos de otimização caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas.[2]
Por conseguinte, as regras são normas que determinam a prática de um ato ou a realização de uma conduta em sua totalidade, não admitindo que estas sejam cumpridas em medidas.
Para que se faça a diferenciação de uma norma constitucional a fim de saber se esta se trata de uma regra ou princípio, deve-se analisar se podem ser cumpridas ou aplicadas de maneira gradual como mandamentos de otimização[3], ou se apenas podem ser cumpridas ou descumpridas como “tudo ou nada”, assim como são as regras.
Ao analisar a seguinte norma: “é garantido ao servidor público civil o direito à livre associação sindical;” percebe-se que não se trata de um princípio, mas sim uma regra. Esta norma não permite o seu cumprimento em graus, de maneira gradual ou qualitativa. O dispositivo supracitado nos traz uma regra que deve ser aplicadas em sua totalidade, sendo admitida exceção em sua aplicação apenas nos casos previstos pela própria Constituição (no caso, quando esta traz exceção para os militares).
Então, pode se perceber, que existe no presente caso, a colisão entre uma regra prevista pela Constituição Federal e uma regra prevista por uma lei ordinária municipal. Portanto, como já ensinado por Kelsen[4], quando existir um conflito abstrato de regras, ou seja, uma antinomia entre elas, deve se buscar os critérios de resolução, sendo que o primeiro deles, como anteriormente dito, é o da ‘hierarquia’, ou seja, o critério ‘lei superior derroga lei inferior’.
Ora, é mais do que obvio que as regras previstas pela constituição devem prevalecer em face das regras da lei municipal ora impugnada, estas que devem ser consideradas nulas ab initio[5].
Mesmo se o magistrado entender ser a norma constitucional supracitadas um princípio, o que discorda o impetrante, pois entende ser este entendimento uma aberração jurídica, deve-se saber, conforme já dito, que estes são mandamentos de otimização e que devem ser aplicados no maior grau possível. Ora, Alexy afirma que quando houver colisão de princípios, deve então haver um
(...) sopesamento entre os interesses conflitantes’. O objetivo deste sopesamento é definir qual dos interesses – que abstratamente estão no mesmo nível – tem maior peso no caso concreto(...)[6]
sem que ocorresse a invalidação de qualquer um deles.
Uma das justificativas da administração pública de Belo Horizonte é que o guarda municipal deve receber um tratamento diferenciado por ser órgão de segurança pública que tem como preceitos a hierarquia e a disciplina, semelhante ao militar. Esta justificativa é um tanto falaciosa. O guarda municipal não é semelhante ao militar. Não é preparado para a guerra, não é força auxiliar das forças armadas assim como a PM[7] e o CBM[8], não utiliza arma de fogo, não se aloja em quartel, não faz patrulha de prevenção ou repressão a criminalidade, mas desempenha atividade semelhante à de um agente de segurança patrimonial, pois na maioria das vezes fica alojado, fazendo a segurança dos próprios municipais.
Não é razoável impedir o guarda municipal de sindicalizar e se organizar em sindicatos para proteger e reivindicar seus direitos sob o argumento que isto afetará de maneira considerável o princípio da segurança pública. Não aplicar neste caso o princípio da dignidade da pessoa humana sob o pretexto de que prevaleceria o princípio da ordem pública ou da segurança pública é irracional e insustentável como argumento jurídico.
Portanto, o direito a livre sindicalização e a proteção dos direitos e prerrogativas de um dirigente sindical é um direito constitucional que não pode ser de maneira alguma violado por qualquer lei municipal. As normas ditadas pelos artigos 130 da Lei do Município de Belo Horizonte de nº 9319/2007 não podem lograr êxito, pois violam frontalmente dispositivos constitucionais. A Constituição é clara ao garantir a liberdade de reunião, de manifestação do pensamento e de reivindicação dos direitos sociais, ao passo que permite a sindicalização para todo trabalhador e para todo servidor público civil, restringindo este direito apenas ao militar. Portanto, as normas que proíbem a sindicalização dos guardas municipais de Belo Horizonte são extremamente injustas ao ponto de serem insustentáveis, pois violam de maneira brutal o princípio da dignidade da pessoa humana.
Em meados do século XX, o jurista alemão Gustav Radbruch, propôs sua fórmula[9] para solucionar o conflito entre justiça material, legalidade conforme o ordenamento e segurança jurídica:
as normas individuais de um sistema jurídico perdem o caráter jurídico quando determinado limiar da injustiça ou da iniquidade é transposto. Sua variante mais conhecida e a formula de Radbruch, cuja solidez já foi discutida e negada a partir de um ponto de vista de um observador. Doravante, trata-se de saber se o argumento da injustiça do modo como a formula de Radbruch o exprime, é aceitável do ponto de vista de um participante. Para tanto, ressalte-se que a formula de Radbruch não afirma que uma norma perde seu caráter jurídico por ser injusta. O limiar é fixado mais acima. O caráter de justiça só há de se perder se a justiça atingir um grau insustentável.[10]
Radbruch e Alexy entendem, conforme a tese da vinculação ou conexão[11], que uma norma extremamente injusta não pode ser Direito, tendo, portanto, que ser corrigida pelo poder judiciário. A história dos países totalitários, sobretudo da Alemanha nacional-socialista, nos mostra a necessidade dessa correção material da norma injusta.
Enfim, a Lei Municipal 9319/2007 traz normas em que sua injustiça é insustentável tendo em vista que hoje, no âmbito da Guarda Municipal de Belo Horizonte, existe um considerável número de guardas que vão até os meios de comunicação para se queixar do tratamento que são submetidos pelos seus superiores hierárquicos, sendo notória inclusive uma greve de fome feita por três guardas municipais de Belo Horizonte, demitidos pelo fato de serem sindicalizados.
Desde o século XIX, é conhecida a pirâmide de Kelsen, teoria que trata de fundamentar a validede (Gültigkeit)[12] que se encontram as normas infraconstitucionais frente às constitucionais, que tem o seu fundamento de validade na Constituição, esta que por sua vez, tem seu fundamento de validade na norma fundamental qual seja: o dever de obediência ao ordenamento jurídico que é explicitado pela própria Constituição.
No entanto, nos parece que o Município de Belo Horizonte, em pleno século XXI não conhece o significado de supremacia da constituição, pois se dispõe a instaurar procedimento disciplinar em desfavor do guarda municipal sindicalizado e reconhece a validade de um dispositivo absurdamente inconstitucional.
Por mais que existam dispositivos inconstitucionais em lei municipal que proíbam os exercícios do direito a sindicalização dos guardas municipais, estes não podem prevalecer quando na aplicação do caso concreto sob a pena de ferir o princípio da supremacia da constituição e, conseqüentemente, ferir e negar a existência do estado de direito.
[1] SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 6ª Ed. São Paulo: Malheiros. 2002. p. 102.
[2] ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução Virgilio Afonso da Silva da 5ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008. P. 90.
[3] O conceito de mandamento é aqui utilizado em um sentido amplo, que também inclui as proibições e as permições.
[4] KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução João Baptista Machado. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
[5] Tradução: ‘desde o princípio’
[6] ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução Virgilio Afonso da Silva da 5ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008. P. 93.
[7] Polícia Militar.
[8] Corpo de Bombeiros Militar.
[9] RADBRUCH, Gustav. Filosofia do Direito. Trad. de Luís Cabral de Moncada. Portugal, Coimbra: Armênio Amado.
[10] ALEXY, Robert. Conceito e Validade do Direito. Tradução Gercélia Batista de Oliveira Mendez. 1. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 48.
[11] A tese da vinculação ou conexão defende que a Moral é fonte necessária do Direito.
[12] Tradução: Validez.