Atribuição Constitucional das Guardas Municipais
Artigo do
Dr. Annibal Bassan Júnior, Delegado de Polícia aposentado, e um dos mais
brilhantes professores da ESPC - Escola Superior de Polícia Civil
É a Guarda Municipal a Polícia do Município?
Primeiramente uma breve explanação conceitual, no caso, a
distinção entre atribuição e competência.
Tomados comumente como sinônimos, nem mesmo na doutrina
mais abalizada é pacífica sua definição.
Vamos aqui entender da seguinte forma:
Atribuição: a soma dos serviços (atributos) a serem
realizados por um determinado órgão.
Competência: a capacidade de conhecer e deliberar sobre
os assuntos contidos no elenco das atribuições delimitando o exercício da
jurisdição.
Apenas para referência temos duas espécies de jurisdição:
a administrativa e a judicial, esta última dizendo o direito derradeiro.
A Constituição da República tratou da Segurança Pública
no Título V (Da defesa do Estado e das Instituições Democráticas), Capitulo III
(Da Segurança Pública), compondo se todo o referido Capítulo em um único
artigo: o 144.
Aos órgãos de Segurança Pública, tabulados nos incisos do
Art. 144, e o contido em seu parágrafo: oitavo (as Guardas Municipais), deferiu
a Carta de 88 a atribuição geral mencionada no caput, qual seja:
“ a preservação da ordem pública e a incolumidade das
pessoas e do patrimônio,...”
Mas, não só isso fez, determinou ele, o Art. 144, que “A
segurança pública é dever do Estado, ...”, e este Estado é a República
Federativa do Brasil, suas três esferas de governo: União, Estados Membros
juntamente com o Distrito Federal e Territórios e os Municípios."
Desde já, por límpido que é, vamos afastar a idéia de que
administração municipal nada tem de obrigações para com o exercício da
segurança pública. A Constituição nada sugere, nem solicita, ela sempre, e
sistematicamente, MANDA. E, é dever cometido aos administradores das cidades
prestarem aos seus munícipes esta importante função do Estado brasileiro.
Após a expressa menção à atribuição geral, ou genérica,
comum a todos os órgãos de segurança pública, houve por bem o Constituinte
tratar das atribuições especiais, ou especificas, de cada um de per si.
No que diz respeito a Guarda Municipal estabeleceu ser
ela destinada “... à proteção de seus bens, serviços e instalações...”,
referindo-se aos Municípios Brasileiros que poderão, ou não, constituí-las. É
esta a característica que não a colocou como inciso VI da cabeça do preceito: o
fato de ser o único órgão de segurança que sua existência depende de vontade
política.
A título de ilustração, o Legislador Magno Espanhol houve
por bem tomar outro rumo e não tratou de atribuições especiais no texto
constitucional. As remeteu para a legislação ordinária. Fez, tão só, citação à
atribuição geral de los cuerpos y fuerzas de seguridad Del Estado nos seguintes
termos do Art. 104, da Carta Espanhola: proteger el libre ejercicio de los
derechos y libertades y garantizar la seguridad Del ciudadana.
Observe-se que o capitulo em tela traz sete órgãos de
segurança pública em expressa menção, sendo um deles, e apenas um, não
destinado a proteger cidadãos de bons costumes, da ação dos cidadãos que
delinqüem.O Corpo de Bombeiros Militar é este.
A partir do exposto, começamos a delinear o caráter
eminentemente policial do órgão de segurança municipal. A hermenêutica jurídica
traça a interpretação sistemática dos textos legais como método obrigatório
para alcançar a teleologia da norma. Não podemos, ao analisarmos a atribuição
constitucional da Guarda, observar apenas o teor do parágrafo oitavo sem
cortejá-lo com o caput do seu Artigo regente.
Logo, tem o Município dever para com a segurança pública.
Seu principal órgão nesta função recebe a atribuição geral constitucional de
“...preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio...”, dispondo também da atribuição especial de “...proteção dos
bens, serviços e instalações, ...” da esfera de governo à qual pertence.
Assim, a Guarda Municipal é, verdadeiramente, a Polícia
da Cidade à qual se circunscreve, exercendo a inteireza das atribuições
pertinentes a este tipo de órgão público.
Não significa isto que a administração Pública da urbe
não possa organizar e, por via de conseqüência, eleger prioridades. Não só
pode, como é de sua expressa Competência Constitucional prevista no artigo 30,
inciso V, da Magna Carta.
Se os recursos disponibilizados à Polícia da Cidade, são
suficientes apenas para a proteção de seus bens, serviços e instalações, nos
parece de boa prática administrativa uma instrução executiva que priorize o
exercício da atribuição constitucional especial.
A orientação administrativa acima pode mudar, ou até
mesmo deve mudar, atendendo ao imperativo constitucional, no exato momento em
que o administrador público local aferir que a cidade, ou partes dela, sofre de
grave incidência criminal, não estando os órgãos estaduais, os principais
responsáveis pela proteção ao cidadão, todavia não os únicos, dando respostas
que atendam os reclamos da comunidade.
Neste exato momento a Guarda Municipal deve exercer em
sua totalidade a missão que o Constituinte Pátrio sabiamente concedeu.
Annibal Bassan Junior
Professor da Escola Superior de Polícia Civil do Paraná